quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Era uma vez ... uma mulher moçambicana e seus filhos

Era uma vez um casal moçambicano F (homem) e L (a mulher). Se conheceram, se gostaram, ela engravidou, teve um menino, ele construiu uma pequena casa, eles começaram a viver juntos. Nos 3 anos que estiveram juntos, tiveram uma também uma menina e F sutentava sua família  trabalhando nas minas de carvão na África do Sul.

Em 1999, F foi dispensado do trabalho na mineração e voltou para casa doente. Disse a L que não deveriam mais estar juntos como homem e mulher enquanto ele estivesse doente. F Morreu em setembro de 2000 deixando sua amada com duas crianças pequenas para cuidar, sendo que a menina nem havia sido registrada com o nome do pai legitimo. 

Os parentes de F se prontificaram a resolver as questoes documentais e assim o fizeram, sendo que, no atestado de óbito de F, este foi declarado solteiro, sem dependentes e a causa da sua morte teria sido pneumonia. 

Logo após as cerimônias para velar o morto, os parentes próximos de F rumaram à casa de L e iniciaram uma série de ameaças dizendo que o marido havia morrido decorrente dos feitiços que ela havia lançado a ele e que ela e seus filhos deveriam deixar aquele local e nunca mais oportunar a família. De fato, em uma destas ocasioes, L e seus filhos foram expulsos de casa e passaram a noite ao relento. A situação foi contornada por familiares da mesma na manhã seguinte, mas as ameaças continuam desde então. São 10 anos de ameaças. 10 anos nos quais tios, tias, avós e avôs tentam tirar um teto de cima da cabeça de seus dois sobrinhos e netos.

L não se deixou abater. Ela é uma mulher moçambicana. Foi trabalhar de doméstica na casa de brasileiros e assim tem feito desde que o marido faleceu. Sozinha, alimenta, veste e educa seus filhos que se encontram na escola e seguem suas vidas como cristãos.

Nestes 10 anos, L acabou por se apaixonou novamente, mas nunca deixou a casa onde mora por saber que uma vez que saia dela, nunca mais terá chances de voltar. Melhor assim, esta se mostrou uma decisão acertada: a nova paixão trouxe mais uma menina e depois se foi, de vez em quando volta, mas nunca para ajudar, volta em busca de momentos de paixão. L ainda o recebe pois ela é apenas uma mulher, como cada uma de nós, e a pobreza não tira de mulher alguma a capacidade de amar e querer ser amada.

L conseguiu um documento que comprova seu matrimônio com F naqueles 3 anos, mas ainda luta por ter a filha reconhecida com o nome do pai e por ter a casa documentadamente em sua posse para que um dia, se torne propriedade dos filhos. 

Todos os dias ela acorda antes do sol raiar e sai resignada porque ela sabe que se ela esmorecer, não haverá comida, não haverá roupas, não haverá futuro.Ninguém é por ela, a não ser Deus e os patrões que a ajudam. Mas ela ... ela tem que ser por todos.  

terça-feira, 5 de julho de 2011

Tesouros Moçambicanos


Descobri alguns tesouros moçambicanos: PAULINA CHIZIANE e suas obras literárias.
A autora cresceu nos subúrbios da cidade de Maputo, anteriormente chamada Lourenço Marques. Nasceu numa família protestante onde se falavam as línguas Chope e Ronga. Aprendeu a língua portuguesa na escola de uma missão católica. Começou os estudos de Linguística na Universidade Eduardo Mondlane sem, porém, ter concluído o curso. Participou activamente à cena política de Moçambique como membro da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), na qual militou durante a juventude

Em Baladas de amor ao vento, Paulina conta a história de amor Sarnau e Mwando em terras moçambicanas. Leitura agradável, quase dá pra sentir a história acontecendo diante de nossos olhos.
Em O alegre canto do perdiz, a autora nos faz viajar pelo tempo e viver intensamente as histórias de amor de negros, mulatos e portugueses em terras moçambicanas.

Quero ler também:
  • Ventos do Apocalipse
  • O sétimo juramento
  • Niketche: Uma História de Poligamia

O "JET SET" MOÇAMBICANO (por MIA COUTO)

Já vimos que, em Moçambique, não é preciso ser rico. O essencial é parecer rico. Entre parecer e ser vai menos que um passo, a diferença entre um tropeço e uma trapaça.

No nosso caso, a aparência é que faz a essência. Daí que a empresa comece pela fachada, o empresário de sucesso comece pelo sucesso da sua viatura, a felicidade do casamento se faça pela dimensão da festa. A ocasião, diz-se, é que faz o negócio. E é aqui que entra o cenário dos ricos e candidatos a ricos: a encenação do nosso "jet-set".

O "jet-set" como todos sabem é algo que ninguém sabe o que é. Mas reúne a gente de luxo, a gente vazia que enche de vazio as colunas sociais.

O jet-set moçambicano está ainda no início. Aqui seguem umas dicas que, durante o próximo ano, ajudarão qualquer pelintra a candidatar-se a um jet-setista. Haja democracia! As sugestões são gratuitas e estão dispostas na forma de um pequeno manual por desordem alfabética:

Anéis - São imprescindíveis. Fazem parte da montra. O princípio é: quem tem boa aparência é bem aparentado. E quem tem bom parente está a meio caminho para passar dos anéis do senhor à categoria de Senhor dos Anéis O jet-setista nacional deve assemelhar-se a um verdadeiro Saturno, tais os anéis que rodeiam os seus dedos. A ideia é que quem passe nunca confunda o jet-setista com um magaíça*, um pobre, um coitado. Deve-se usar jóias do tipo matacão, ouros e pedras preciosas tão grandes que se poderiam chamar de penedos preciosos. A acompanhar a anelagem deve exibir-se um cordão de ouro, bem visível entre a camisa desabotoada.


Boas maneiras - Não se devem ter. Nem pensar. O bom estilo é agressivo, o arranhão, o grosseiro. Um tipo simpático, de modos afáveis e que se preocupa com os outros? Isso, só uma pessoa que necessita de aprovação da sociedade. O jet-setista nacional não precisa de aprovação de ninguém, já nasceu aprovado. Daí os seus ares de chefe, de gajo mandão, que olha o mundo inteiro com superioridade de patrão. Pára o carro no meio da estrada atrapalhando o trânsito, fura a bicha**, passa à frente, pisa o cidadão anónimo. Onde os outros devem esperar, o jet-setista aproveita para exibir a sua condição de criatura especial. O jet-setista não espera: telefona. E manda. Quando não desmanda.


Cabelo - O nosso jet-setista anda a reboque das modas dos outros. O que vem dos americanos: isso é que é bom. Espreita a MTV e fica deleitado com uns moços cuja única tarefa na vida é fazer de conta que cantam. Os tipos são fantásticos, nesses vídeo-clips: nunca se lhes viu ligação alguma com o trabalho, circulam com viaturas a abarrotar de miúdas descascadas. A vida é fácil para esses meninos.

De onde lhes virá o sustento? Pois esses queridos fazem questão em rapar o cabelo à moda militar, para demonstrar a sua agressividade contra um mundo que os excluiu mas que, ao que parece, lhes abriu a porta para uns tantos luxos. E esses andam de cabelo rapado. Por enquanto.


Cerveja - A solidez do nosso matreco vem dos líquidos. O nosso candidato a jet-setista não simplesmente bebe. Ele tem de mostrar que bebe. Parece um reclame publicitário ambulante. Encontramos o nosso matreco de cerveja na mão em casa, na rua, no automóvel, na casa de banho. As obsessões do matreco nacional variam entre o copo e o corpo (os tipos ginasticam-se bem). Vazam copos e enchem os corpos (de musculaças). As garrafas ou latas vazias são deitadas para o meio da rua. Deitar a lata no depósito do lixo é uma coisa demasiado "educadinha". Boa educação é para os pobres. Bons modos são para quem trabalha. Porque a malta da pesada não precisa de maneiras. Precisa de gangs. Respeito? Isso o dinheiro não compra. Antes vale que os outros tenham medo.


Chapéu - É fundamental. Mas o verdadeiro jet-setista não usa chapéu quando todos os outros usam: ao sol. Eis a criatividade do matreco nacional: chapéu, ele usa na sombra, no interior das viaturas e sob o tecto das casas. Deve ser um chapéu que dê nas vistas. Muito aconselhável é o chapéu de cowboy, à la Texana. Para mostrar a familiaridade do nosso matreco com a rudeza dos domadores de cavalos. Com os que põem o planeta na ordem. Na sua ordem.


Cultura - O jet-setista não lê, não vai ao teatro. A única coisa que ele lê são os rótulos de uísque. A única música que escuta são umas "rapadas e hip-hopadas" que ele generosamente emite da aparelhagem do automóvel para toda a cidade. Os tipos da cultura são, no entender do matreco nacional, uns desgraçados que nunca ficarão ricos. O segredo é o seguinte: o jet-setista nem precisa de estudar. Nem de ter Curriculum Vitae. Para quê? Ele não vai concorrer, os concursos é que vão ter com ele. E para abrir portas basta-lhe o nome. O nome da família, entenda-se.


Carros - O matreco nacional fica maluquinho com viaturas de luxo. É quase uma tara sexual, uma espécie de droga legalmente autorizada. O carro não é para o nosso jet-setista um instrumento, um objecto. É uma divindade, um meio de afirmação. Se pudesse o matreco levava o automóvel para a cama. E, de facto, o sonho mais erótico do nosso jet-setista não é com uma Mercedes. É, com um Mercedes.


Fatos - Têm de ser de Itália. Para não correr o risco do investimento ser em vão, aconselha-se a usar o casaco com os rótulos de fora, não vá a origem da roupa passar despercebida. Um lencinho pode espreitar do bolso, a sugerir que outras coisas podem de lá sair.

Óculos escuros - Essenciais, haja ou não haja claridade. O style - ou em português, o estilo - assim o exige. Devem ser usados em casa, no cinema, enfim, em tudo o que não bate o sol directo. O matreco deve dar a entender que há uma luz especial que lhe vem de dentro da cabeça. Essa a razão do chapéu, mesmo na maior obscuridade.


Simplicidade - A simplicidade é um pecado mortal para a nossa matrecagem. Sobretudo, se se é filho de gente grande. Nesse caso, deve-se gastar à larga e mostrar que isso de país pobre é para os outros.

Porque eles (os meninos de boas famílias) exibem mais ostentação que os filhos dos verdadeiros ricos dos países verdadeiramente ricos. Afinal, ficamos independentes para quê?


Telemóvel - Ui, ui, ui! O celular ou telemóvel já faz parte do braço do matreco, é a sua mais superior extremidade inferior. A marca, o modelo, as luzinhas que acendem, os brilhantes, tudo isso conta. Mas importa, sobretudo, que o toque do celular seja audível a mais de 200 metros. Quem disse que o jet-setista não tem relação com a música clássica? Volume no máximo, pelo aparelho passam os mais cultos trechos: Fur Elise de Beethoven, a Rapsódia Húngara de Franz Liszt, o Danúbio Azul de Strauss. No entanto, a melodia mais adequada para as condições higiénicas de Maputo é o Voo do Moscardo.


Última sugestão: nunca desligue o telemóvel! O que em outro lugar é uma prova de boa educação pode, em Moçambique, ser interpretado como um sinal de fraqueza. Em Conselho de Ministros, na confissão da Igreja, no funeral do avô: mostre que nada é mais importante que as suas inadiáveis comunicações. Você é que é o centro do universo!

quinta-feira, 5 de maio de 2011

TÁ PUTO? VAI PRA MAPUTO!!!!


Tete - Moçambique

Esta era uma brincadeira que costumávamos fazer em Tete quando o calor estava insuportável demais, ou a ponte demorava demais para abrir, ou os mercados não tinham quase nada nas prateleiras, ou quando não havia eletricidade nos finais de semana e quando ficávamos sem água para tomar banho depois de um dia de trabalho.

Maputo - Moçambique

Bom, acontece que agora moramos em Maputo. Não vou negar, é melhor, bem melhor que morar em Tete. Faz três dias que estou fazendo compras em SUPERMERCADOS ... é um luxo, tem de tudo. Enchi os armários e a geladeira de nossa nova casa pois ainda carrego comigo aquele comportamento que desenvolvia em Tete: comprar os produtos pelos simples fato de que estes estão disponíveis. Por exemplo, se eu queria comprar picanha e só achava camarão ... comprava o camarão porque sabia que quando eu quisesse camarão poderia encontrar apenas picanha.

Além disto, Maputo está estrategicamente localizada no sul da África e, a partir daqui, poderemos ter acesso mais rápido a outros países africanos e até mesmo ao litoral maravilhoso que se encontra próximo daqui ... Oba, adoro praia!!!! Morar com vista para o mar é um privilégio maravilhoso. Dormimos com o som das pequenas ondas que se formam e acordamos com os barquinhos ancorados em nossas varandas. Tudo bem que a via costeira é suja e mal pavimentada ... mas, é só olhar para o horizonte e aproveitar.

Mas e este blog? Será que devo trocar o título para Notícias de Maputo?

Acho que não. Somos brasileiros na África. Aprendemos a amar esta terra e as pessoas que nela vivem (claro que há momentos que também sentimos raiva de algumas coisas, como em nosso próprio país). Não importa se estamos em Tete, Maputo, Joburg, Cape Town ... África é uma grande nação composta de contrastes e é aqui que vivemos, é aqui que trabalhamos, é aqui que rimos e choramos e é aqui que ficaremos até que seja a hora de partir. Fica então registrado que Notícias de Tete, a partir de agora, é sinônimo de Notícias de Maputo, Notícias de Moçambique, Notícias dos países africanos ...

Confesso que em minha mente estão eternamente gravadas as imagens de Tete, suas savanas, seu povo andarilho, seus comerciantes, suas crianças, suas riquezas e os amigos que lá fizemos. Uma grande e querida amiga escolheu uma metáfora perfeita sobre as chegadas e as despedidas de pessoas que nos são queridas comparando-as as plantas arrancadas da terra e transplantadas para continuar a crescer em solos mais férteis e como as plantas que ficam tem que se adaptar ao novo jardim (veja abaixo). Da mesma forma, sei que plantamos o bem (pelo menos tentamos arduamente) e as pessoas sentirão nossa falta, sentirão saudade da família brasileira que chegou, trouxe alegria, modificou o cenário e depois partiu.

Thursday, April 7, 2011Despedindo ao Brasil



We've enjoyed the Brazilian friends we have met through the Zambezi Jr. School here in Tete. They came as "set up" crew for the new mining boom. They brought their children into the African unknown with a hope to grow and make a difference in a hard place. They have added a new wrinkle to the Tete landscape and the school's culture. We have carpooled and shared ideas and dreams and frustrations about living in this place.They have let us invade their homes (when our home was no real refuge.) They have walked beside us and prayed beside us. We have been friends!


In February, one family relocated to Malawi leaving holes in the classrooms they left. Then we heard that the second family was relocating as well. Just this morning I learned that a departure planned for May was moved up to tomorrow. When they leave for vacation, they won't return to Tete, but will set up house in Maputo.


In this life we have chosen we are faced with constant turnover. We meet new friends and grow close fast. We all need more from a friendship when we are away from family and our home culture. One drawback of the "quick and deep" friendship is the inevitable despedida... saying goodbye to people we've grown to love in our adopted home.


I write about leaving as much as I write about arriving. It is all part of the same process: that pulling up of roots and shaking off the soil so that we can be transplanted where we will continue to grow. The new soil is rich, but our leaves wilt for a while as we wait for the new place to begin to nourish us. Look at that garden we left: there is a hole there where a healthy plant shared the sun and shade and water. We have grown together and my leaves and branches have been shaped by their presence. Now, there is a space beside me. If I'm lucky, the Gardener will bring in a new seed of friendship before long. Maybe He will bring a transplant to share my garden. Or maybe I will branch out and fill the space with new growth. It will be good either way. We will all have a chance to grow and bear fruit!


To my Brazilian Tete friends:


Vos desejo tudo bom, caras amigas minhas! Cresçam no lugar onde Deus vos plantou! Sigam a Ele e façam uma diferença na África que vos abraçou! Ensinem os filhos a lidar com uma medida do sofrimento dos outros. E saibam que se Tete ficou lugar amado, era por vontade de Deus... no superficie esta cidade não oferece uma vida rica, mas foi rica, não foi?
 

quinta-feira, 14 de abril de 2011

AMÉRICO, O FAVORITO DO PATRÃO E DA PATROA

Meu marido tem a seguinte opinião: se não podemos ajudar a todos, devemos escolher um ou dois para tentarmos ajudar. Ao chegar em Tete, ele escolheu um menino chamado Américo para ser seu 'favorito'. Mesmo antes da minha mudança há dois anos, meu marido já falava sobre o menino e como ele ajudava seu avô cego a pedir esmolas pelas ruas da cidade. Em meu primeiro dia em Tete, fomos apresentados e, de fato, havia nele algo diferente das outras crianças ... uma tristeza camuflada, um potencial adormecido, um rosto de idoso em um corpo juvenil. 

Ao dirigir para a cidade para fazer compras e ter o carro cercado por dezenas de crianças, eu dizia que só o Américo devia cuidar do carro. Ele começou a perceber que tínhamos uma atenção especial para com ele. Nos chamava de patrão e patroa, mas eu acabei por dizer meu nome a ele. O fato é que meu nome ficou conhecido por todas as crianças da cidade que, quando me viam, começam a gritar: Chama o Américo que a Dona S. chegou. Quando o encontrava sozinho, fazia compras no mercado para ele e dizia que levasse para casa e pedisse para algum adulto preparar o alimento. Descobri que ele era órfão e morava apenas com o avô cego, que, posteriormente faleceu e o deixou sozinho no mundo. 

E foi nesta época que Américo chegou na porta da minha casa (sabe Deus como ele achou minha casa que é longe da cidade) pedindo ajuda. Liguei para o meu marido e conversamos sobre como ajudá-lo. Desconsiderando o sentimento e deixando a razão falar mais forte, dei alimento e dinheiro a ele e o levei de volta à cidade. Neste dia, me arrependi por ter dado a ele uma atenção especial e provavelmente ter criado a falsa esperança de que eu poderia resolver seus problemas.

Cheguei a conversar com uma tia do menino sobre a possibilidade dele morar na casa dela e ofereci um 'cesta básica' à família todos os meses por esta hospedagem. Entretanto, tempos depois, soube que o marido da tia negou esta proposta. Tentei ajudá-lo de outras formas, recuperando documentos, comprando roupas e sapatos. De fato, ele andava pela cidade com  todas as peças de roupas que possuía, provavelmente porque se as deixassem em algum lugar elas seriam roubadas. Em uma das lojas de roupas, me surpreendi com suas escolhas ... ao invés das camisetas super estilosas que eu mostrava a ele ... ele pediu uma camisa com botões e, ao invés do par de tênis da moda que eu também mostrava a ele ... ele pediu um par de sapatos pretos brilhantes e um par de meias brancas ... no final, ele ficou parecendo o Michael Jackson antes de se tornar branco.

Pensei em buscar um colégio interno e pagar por sua educação, mas ele não trouxe os documentos necessários para que eu pudesse tomar as providências. De qualquer forma, os amigos da rua são a sua única e real família e tirar isto dele seria tirar o galho no qual ele se agarrava para não ser levado pela correnteza.

Estes dias contei a ele que estava de mudança para Maputo e ele não respondeu nada. Fez cara de quem não estava entendendo o que eu dizia. Imagino o que vai ser do Américo no futuro. Para que minhas previsões sejam realistas, elas são, obrigatoriamente, pessimistas. Sem uma família, sem apoio, sem escola, sem lar ... mas o mundo é cheio de milagres e eu espero que um deles aconteça na vida do menino Américo.

NOSSA VIAGEM A VILANCULOS E OS MOTIVOS QUE DIFICULTAM O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO EM MOÇAMBIQUE


FATO INCONTESTÁVEL E COMPROVADO NA IMAGEM ACIMA:
O litoral de Moçambique é maravilhoso e já existem resorts fantásticos em suas costas e ilhas.

PORÉNS, TODAVIAS, ENTRETANTOS:
Alguns 'elementos' prejudicam o turismo no país e minha última experiência com amigas na viagem TETE - VILANCULOS deixaram estes elementos muito claros. Vamos à lista dos indesejáveis:

1) LINHAS AÉREAS MOÇAMBICANAS
Começo a lista com aquela que, ao meu ver, é uma empresa que cobra extremamente caro, tem um programa de milhagem fajuto, não respeita seus clientes e cuja logística inadequada de voos impede o que o turismo deslanche em Moçambique - a famosa (por seus atrasos e lanchinhos muchos que dão dor de estômago) LAM, exemplo de como um monopólio pode resultar em péssimos serviços.
Sobre nossa aventura TETE - VILANCULOS, tenho a dizer que para um voo de 50 minutos para Beira se transformou em uma espera de 6 horas no aeroporto de Tete. Nosso avião chegou, saiu com outros passageiros e voltou com os mesmos (não conseguiram pousar em Quilimane) e toda esta baldeação nos fez pernoitar em Beira.

2) TURISMO DE QUALIDADE APENAS PARA QUEM TEM MUITOS DÓLARES
Se quiser passar suas férias no litoral Moçambicano se hospedando em um local bom, equipado, limpo, bonito e com boa comida (assim como todos merecemos quando estamos de férias), prepare-se para gastar muitos dólares. Em Vilanculos, ficamos hospedadas no Vilanculos Beach Lodge, um luxo ... que custa caro. As redes PESTANA e RANI são as que oferecem as melhores opções para aqueles que não se importam em transformar as férias em um momento de 'investimento'.
http://www.pestana.com/hotels/pt/hotels/africa/
http://www.raniresorts.com/

3) MÃO DE OBRA DESQUALIFICADA
Como mencionei acima, os grandes hotéis e resorts de Moçambique são de grupos estrangeiros. Notei também que os gerentes dos hotéis também costumam ser estrangeiros, mas o resto da mão de obra é moçambicana. Entretanto, o despreparo é imenso.
Apelidamos o motorista que nos levou de Beira à Vilanculos de MONSTRORISTA porque ele era um cara muito maluco que dirigia a 150Km por hora e não atendia nossos pedidos de reduzir a velocidade.
No hotel, em nosso primeiro jantar, o coitado do rapaz não conseguia marcar nossos pedidos. Foi constrangedor ver como ele estava despreparado para aquela função.
Também no hotel, contratamos um passeio de snorkeling que quase acabou se tornando um pesadelo. Para resumir o assunto, quase nos afogamos em um local de mar super agitado (totalmente inapropriado para snorkeling) e chegamos com o corpo todo dolorido porque a lanche nos jogava de um lado para outro como marionetes. Se não tivesse sido quase trágico, teria sido totalmente cômico.

CONCLUSÃO:
Espero que estas minhas palavras sirvam de incentivo para que Moçambique encontre um caminho para o desenvolvimento de seu turismo porque a natureza já fez o seu trabalho ... com muita competência.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

TRADUZINDO EM PALAVRAS ....

Faz tempo que não escrevo. O final de 2010 foi muito corrido e tivemos visitas aqui em Tete no início deste ano. Foi interessante presenciar nossos convidados tentando 'traduzir em palavras' o que sentiam e o que pensavam sobre estar no interior de Moçambique, em continente africano.

Um de nossos convidados usou a palavra RIQUEZA. Obviamente não falava sobre dinheiro ou bens materiais, mas referia-se a riqueza das cores, riqueza dos movimentos, riqueza cultural, riqueza de sorrisos.

Outra convidada usou a palavra MAGIA para se referir às inúmeras atribuições das capulanas com as quais as mulheres moçambicanas mantêm seus bebês presos ao seus corpos, criam saias, vestidos, chapéus,  se protegem do sol e da chuva, forram o chão para vender os produtos de suas maxambas e improvisam cortinas para suas casas de barro. Pensando bem, parece mesmo um pano mágico.

Alguns convidados nada disseram. Não ousaram buscar palavras para algo tão novo. Preferiram refletir sobre a experiência antes de se pronunciarem.

Eu, que já moro aqui há quase dois anos, usaria a palavra INTENSO. O calor, os sentimentos que afloram(de amor e de ódio), a beleza das savanas, a alegria das músicas ... tudo é intenso. Aqui não há lugar para poucas emoções, nem para meias palavras.